11/06/2012 - RESIDUOS - Meio Ambiente
Limites e desafios da coleta seletiva em debate
Painel realizado pela Eletrosul reúne Ministério Público, empresários, catadores e Comcap

foto/divulgação:

 Painel sobre coleta seletiva (Crédito foto: Anisio Borges/Eletrosul)

Os desafios e limites da coleta seletiva e da reciclagem em Florianópolis foram discutidos em painel realizado pela Eletrosul, dia 6, com a participação da Comcap, UFSC, Ministério Público, empresários e catadores. Na ocasião, o presidente Marius Bagnati defendeu soluções regionais integradas e um plano estratégico estadual para que possam ser cumpridas as metas da Política Nacional de Resíduos Sólidos.

 

 

No sistema formal de coleta seletiva da Capital, informou, hoje são encaminhados à reciclagem 7% do total de resíduos sólidos recolhidos pela Comcap. Na hipótese mais conservadora, o percentual desviado do aterro sanitário deverá ser de 43% do total em 2015 e, na mais favorável, de 70%. “O que vamos fazer com tudo isso? Há mercado para tudo isso?”, questionou Bagnati.

 

 

Hoje, Florianópolis recolhe em um mês mil toneladas de recicláveis secos, quantidade que há menos de uma década, levava um ano para atingir. “A coleta seletiva custa seis vezes mais que a coleta convencional, as duas cooperativas mais estruturadas chegaram ao limite de triagem, há um problema de sazonalidade e uma logística de alto custo para escoar os materiais à indústria da reciclagem”, resumiu Bagnati.

 

 

Esse tipo de problema, apontou o presidente da Comcap, é comum a todos os municípios de médio e grande porte e tende a aumentar na medida em que crescerá a obrigatoriedade de pessoas e empresas separarem os resíduos.

 

 

Por isso, propôs, é preciso implantar um consórcio intermunicipal, coletas diferenciadas para recicláveis secos e orgânicos, organizar juridicamente e dar suporte técnico às cooperativas. “É preciso que o governo estabeleça um plano estadual estratégico de gestão de resíduos, promovendo a instalação de polos da indústria da reciclagem nas diversas centralidades como a da Grande Florianópolis”, observou.

 

 

Na avaliação de Bagnati, o País passou, em pouco mais de meio século, da produção de bens que duravam uma vida inteira na família para um alto consumo de descartáveis. “Está na hora de mudar o padrão de consumo, porque estamos exaurindo os recursos naturais e gerando quantidade exagerada de lixo.”

 

 

  • Informal e sem estrutura

O professor da UFSC Israel Aquino apontou que, no Brasil, de 11 a 13% dos resíduos são encaminhados à reciclagem, sendo que, pelo sistema formal de coleta não passam mais que 20% desse total. A maior parte é destinada por catadores e sucateiros em atividade ainda informal.

 

 

Em Santa Catarina, as estimativas mais recentes dão conta da existência de 31 unidades de triagem, com 750 trabalhadores associados, um quarto apenas do total de 3 mil catadores. Essas unidades registraram produção de 1,8 mil toneladas por mês, numa média de 2,5 toneladas por catador/mês, o que permite uma renda de R$ 712 (acima do salário mínimo e da média nacional que é de R$ 420 a R$ 520). Ainda assim, em associações mais organizadas como a ACMR, na Capital, a produtividade sobe para 4,5 toneladas por catador a cada mês.

 

 

Setenta e cinco por cento das pessoas envolvidas da catação e triagem de materiais recicláveis, contudo, não contribuem com INSS, a maioria não usa equipamentos de proteção individual (EPIs) e, com poucas exceções, preicsam de capacitação e assessoria para comercializar o material processado. 

 

 

  • Baixo preço dos recicláveis

O empresário do ramo de reciclagem de papel e papelão Márcio Almeida disse que, ao contrário do que as pessoas em geral pensam, assim que separam o material para a coleta seletiva é que tem começado o problema. “No Brasil, somos pouco estrategistas, não enxergamos 30 ou 40 anos na frente, mas se enxergássemos, veríamos que o cenário tende a ficar cada vez pior. Nas cooperativas já estão trabalhando o dobro e ganhando a metade”, disse.

 

 

Segundo ele, se as cooperativas não passarem a ser remuneradas pela prestação do serviço de separação dos materiais recicláveis, não terão condições de sobreviver mais cinco anos. “Quanto mais reciclamos, mas baixa a renda de quem depende da separação e venda desse material.”

 

  • “A reciclagem é uma novela”

Aparecida Maria da Silva lidera uma associação de triadores, a Acareli, em Palhoça. “A reciclagem é uma novela: comecei com saco na mão, catando na beirada da rua, hoje o galpão tem lajota e cobertura, ninguém mais trabalha na chuva, mas é difícil contar quanto foi doído, quanto tivemos de chorar e espernear”, relatou. Segundo ela, depois de uma experiência mal sucedida como empresa, teve apoio da Comcap e da antiga Escola Técnica (hoje ITSC) para organizar a associação. Hoje, volta a enfrentar dificuldades com a baixa receita obtida na venda dos materiais recicláveis.

 

 

A associação manteve parceria com o Instituto Vonpar (da distribuidora Coca-Cola) e com a Univali e hoje conta com apoio da Eletrosul.

 

  • Preservação da renda

Dorival Rodrigues dos Santos, presidente da Abaclim e liderança do Movimento Nacional de Catadores, está preocupado com a brecha que a Política Nacional de Resíduos Sólidos manteve em relação à incineração de resíduos sólidos. “O catador não tem estrutura, não consegue terreno para sua associação, é empurrado para o fundão das cidades, como se estivesse fazendo coisa errada, quando quem produz o lixo é a sociedade. Mas não vai permitir que acabem com sua renda.”

 

  • Logística reversa

O promotor Rui Arno Richter, que intermediou pelo Ministério Público do Estado de Santa Catarina o acordo entre a Prefeitura de Florianópolis e ACMR, em 2009, para remoção dos catadores de área no Centro para o galpão da Comcap no Itacorubi, gostou de ouvir de Dorival dos Santos que a medida melhorou a vida daquelas famílias. Richter observou os vínculos entre a crise internacional e a situação da reciclagem e criticou a bolha de crédito que tem sido criada no Brasil para manter a roda-viva do consumo.

 

 

Também defendeu a atribuição de responsabilidades aos atores privados. “Só com ajuda do governo às associações e cooperativas não vai se resolver o problema, ficaremos no ciclo sem fim do fundo sem fundo, como identificou a dona Aparecida.” Segundo ele, “a logística reversa é o principal instituto da nova lei, porque cria um meio jurídico de tentar modular essa nossa natureza humana interesseira e predatória.”


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