Secretaria Municipal de Educação
Na Escola Básica Municipal Virgílio dos Reis Várzea, em Florianópolis, as turmas do nono ano do ensino fundamental iniciaram os estudos de Língua Portuguesa do primeiro bimestre concentrados em contos psicológicos, narrações vividas ou sentidas pelas personagens. Os textos bases foram “Restos de Carnaval”, da escritora Clarice Lispector, e “Eu estava ali deitado”, de Luiz Vilela.
O primeiro trata das lembranças e dilemas vividos pela protagonista durante a infância na época do carnaval. O segundo aborda dilemas relacionados à paixão de um adolescente, cujos sentimentos, emoções, memórias e pensamentos tecem o enredo.
Nas aulas da professora Luciane Sandra dos Reis Ferreira, por intermédio dos textos a garotada discutiu não apenas as características de um conto psicológico, sua estrutura e tempo verbal utilizado, como também debateu sobre os dilemas vividos pelos adolescentes no cotidiano.
Entre os temas abordados encontram-se valores referentes à felicidade e às descobertas desta fase intermediária entre a infância e a fase adulta.
A partir disso os estudantes produziram seus próprios contos psicológicos.
“Percebi o quanto é difícil para um adolescente expressar seus sentimentos e conversar sobre seu mundo interior, permitir-se abrir para o outro; as conversas durante as aulas proporcionaram que os alunos pudessem pensar sobre seus próprios dilemas” relata a professora.
No segundo bimestre o trabalho foi ampliado. Os estudantes foram desafiados a transformarem o conto escrito em uma produção audiovisual navegável utilizando tablets ou smartphones.
A inspiração veio do mestrado da professora de Tecnologia Educacional da Escola Virgílio Várzea, estabelecimento localizado no bairro Canasvieiras, Norte da Ilha. Sandra Dias da Luz está desenvolvendo pela Universidade Federal de Santa Catarina a dissertação “Narrativas digitais em dispositivos móveis”. Para isso, foi analisado com os alunos um videoconto do livro “O Alienista”, de Machado de Assis.
A pesquisa de Sandra foca na identificação de como são inseridos dispositivos móveis na prática escolar através de narrativas de estudantes. Em comum acordo com a direção da unidade escolar, a professora de tecnologia educacional está acompanhando as turmas, desde o ano passado, que agora encontram- se no último ano do ensino fundamental.
Com a aplicação de um questionário, a pesquisadora constatou que os adolescentes gostariam de produzir e editar vídeos.
Oficinas de mídia- educação
Para incentivar a garotada foram realizadas nas aulas de Língua Portuguesa oficinas de mídia-educação. Nestas oficinas foram desenvolvidas atividades como análise de produções audiovisuais corporativas e consumidas culturalmente pelos estudantes. São séries, videos, traillers, clips, novelas, desenhos, que são produzidos por empresas e veiculadas na TV ou internet.
Conforme relato de Sandra, “diante de suas preferências e gostos fomos analisando criticamente, pensando na mensagem da obra e como a mídia auxilia na transmissão dessa mensagem, como nas cores, por exemplo. É comum a cor vermelha ser representada como paixão, mas se seu tom for mais escuro, significa raiva, assim como o preto e branco são utilizados para marcar um tempo passado”.
Houve experimentações com a câmera de celulares, para que eles fossem além do uso do aparelho para selfies ou de enquadramentos do mesmo ponto. Nestas experiências, os alunos produziram o conhecido Minuto Lumière, em que é filmado um minuto de uma cena do cotidiano sem interferência ou som. As câmeras também foram colocadas num balanço, no skate e penduradas como um colar para experimentação de cada sensação.
As produções sempre eram comentadas considerando a intencionalidade da imagem com o que de fato foi capturado. “Desta forma, os alunos foram instigados a serem produtores de conteúdos e a refletir sobre isso, o que já modifica seu perfil para um aluno mais ativo”, diz Sandra Dias da Luz.
A garotada praticou diferentes aplicativos para edição de imagem, narração, sonoplastia e aplicativos específicos para edição de vídeos, levando em consideração a limitação de cada App.
O estudo do roteiro está presente no currículo do nono ano e foi utilizado neste projeto para criar orientações para as filmagens, a exemplo de diálogos, cenário, caracterização das personagens, posição na cena, equipamento necessário e efeitos da edição.
Após a produção dos primeiros vídeocontos, os alunos receberam formulários para que avaliassem cada elemento do vídeo produzido pelos outros grupos: conto (estrutura) e mídia (elementos: visuais, sonoros, gestuais, espaciais, escritos e edição).
Assim, com a crítica ao trabalho do outro, eles exercitaram o olhar sobre si próprios, fazendo parte de um processo de consciência desses itens, salienta Sandra. A autoavaliação veio na sequência, e aí sim os grupos analisaram a contribuição individual, considerando a habilidade de cada indivíduo como fundamental para execução do videoconto.
O Segundo videconto
Após os alunos receberem a avaliação feita pelos colegas e terem refletido sobre suas próprias produções, foi proposto a reelaboração de cada video-conto.
O desafio foi ler os livros “O mistério da casa verde”, de Moacyr Scilar, e em seguida a obra “O alienista”, de Machado de Assis, acrescentando em cada história criada a personagem do médico psiquiatra Simão Bacamarte como elo entre os contos.
A garota sozinha
Em todas as narrativas existe uma situação inicial que desencadeia um conflito em que o protagonista reflete sobre sentimentos comuns a todos, tais como solidão, culpa, insegurança, desilusão amorosa, temas muito próximos ao universo juvenil, como em "A garota sozinha".
Neste videoconto a protagonista inicia seus estudos em uma nova escola e revive o momento do passado em que aconteceu o mesmo ao ingressar na antiga escola.
Ela se sente deslocada, não tem amigos, todos a olham com indiferença, mas a garota conhece uma amiga que passa pela mesma situação.
Becca, a personagem principal, desabafa com essa amiga sobre as loucuras de seu pai Simão Bacamarte, o alienista, referenciando-se à obra de Machado de Assis e revelando a personalidade do médico, dentro de um contexto atual.
A escolha para navegar
O trabalho teve como resultado a produção de 11 videocontos. As narrativas foram introduzidas por um vídeo que apresenta Simão Bacamarte em um dia de trabalho na Casa Verde, uma espécie de manicômio.
A ligação entre as 11 histórias permite a liberdade de navegação, o internauta não precisa conhecer todos os vídeos-contos e amplia a experiência com a obra de Machado de Assis, uma vez que pode conhecer as diversas opiniões de Bacamarte, em diferentes realidades.
Tecnologia na sala de aula
De acordo com o secretário de Educação Maurício Fernandes Pereira, a ideia principal não é abandonar as formas tradicionais de ensino, mas utilizar as novas tecnologias em conjunto. “Hoje, com todos os avanços, existe a necessidade de adequação, de abertura para o novo, a fim de tornar as aulas mais atraentes, participativas e eficientes”, completa.
Relação dos videocontos
Em busca de um sonho
Viagem a Fernando de Noronha
Uma boa mãe
A garota sozinha
Lembranças de infância
Quebrando como as ondas
Aquele momento
O retrato
O bullyng
Minha cidade natal
Um dia de emoção