Secretaria Municipal de Saúde

25/10/2010 - Saúde
Saiba mais sobre a Saúde Mental em Florianópolis
Notasobre a Rede de Saúde Mental do município

Em referência a emails divulgados denegrindo a saúde mental em Florianópolis, vimos a público afirmar que o trabalho de estruturação da rede de saúde mental segue os princípios da Reforma Psiquiátrica e Reforma Sanitária. Por seguirmos esses princípios, prezamos pela garantia da oferta de um serviço acessível e de qualidade para a população do nosso município.

 

Apesar de ainda termos muito a avançar, passamos por grandes conquistas nos últimos anos por exercemos com seriedade e compromisso a função pública.

 

Defender a Reforma Psiquiátrica está em sairmos da posição do discurso inflamado e indignado e “arregaçarmos as mangas” para a construção de um bem comum maior do que nós. Defender a Reforma é sermos responsáveis com a qualidade do serviço prestado, sermos coerentes com o discurso, termos a coragem de debatermos com seriedade as múltiplas visões do mundo e aceitarmos de fato o desafio da construção coletiva.

 

Entretanto, como a teoria e o discurso servem apenas para embasar e nortear uma prática, concretamente descrevemos o nosso trabalho, realizado nos últimos 5 anos e meio:

 

  • Aumento das equipes de saúde mental na atenção primária à saúde (APS) triplicando o numero de psicólogos e psiquiatras. Tendo como base a Portaria nº 648/GM, de 28 de março de 2006, no Município de Florianópolis, a Atenção Primaria é a coordenadora do cuidado e porta de entrada preferencial do sistema de saúde;
  • Incremento do número de Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), com a criação do segundo Centro de Atenção Psicossocial para pessoas com problemas com álcool e outras drogas (CAPSad);
  • Integração das equipes de Saúde da Família com as equipes de Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF) e CAPS através da institucionalização de espaços regulares de discussão entre os dispositivos;
  • Elaboração do protocolo de saúde mental com a participação dos profissionais da rede, instituições parceiras e do Conselho Municipal de Saúde (CMS);
  • Incorporação das equipes de saúde mental da atenção primária aos NASF o que possibilitou fornecer gratificação de saúde da família aos profissionais da psicologia e serviço social;
  • Normatização da possibilidade de psicólogo complementar por equipe NASF devido a alta prevalência de sofrimento psíquico na APS e a quantidade superior de psicólogos já existentes na atenção primária ao número de equipes NASF implantadas;
  • Capacitação multiprofissional envolvendo profissionais dos diversos níveis de assistência dentro modelo de apoio matricial;
  • Capacitação do protocolo terapêutico envolvendo profissionais da rede e, este ano, capacitação para os agentes comunitários ministrada por profissionais da nossa rede e mais uma para os profissionais de nível médio;
  • Aumento das equipes de agentes redutores de danos e sua incorporação as equipes dos CAPS ad;
  • Implantação do consultório de rua a fim de ampliar as ações territoriais relacionadas a álcool e outras drogas com foco na população em situação de vulnerabilidade;
  • Incremento das ações intersetoriais com a comissão de álcool e drogas e a comissão para a criação de uma política municipal de atenção ao morador de rua;
  • Integração entre ensino e serviço, através do Pró-saúde, Pet-saúde, Pró-residência, e agora o Pet saúde mental.

 

Considerando as propostas levantadas na I Conferência Municipal de Saúde Mental de Florianópolis referentes à ampliação de serviços substitutivos, o Secretário Municipal de Saúde aprovou a elaboração do projeto da residência terapêutica, com a pronta cessão de terreno para a mesma. Estabelecemos uma comissão com a Secretaria Estadual de Saúde e Hospital Universitário para a implantação da emergência psiquiátrica, que já está com espaço definido e em fase de elaboração do projeto arquitetônico. Esta comissão visa à criação da emergência psiquiátrica no Hospital Universitário (com posterior transformação do CAPS Ponta do Coral e CAPS ad Ilha em CAPS III), e a articulação entre a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) e o Instituto de Psiquiatria para acompanhamento conjunto de pessoas com transtorno mental grave que ainda internam nesse hospital, evitando sua reinternação e possibilitando acompanhamento no CAPS.

 

Aqui fazemos a ressalva de que, ao iniciarmos essa articulação, os servidores signatários da carta em questão se posicionaram de forma contrária, alegando que não seria o CAPS o serviço indicado para acolher as pessoas que passaram um mês internadas no hospital psiquiátrico, como também foram contra o protocolo de saúde mental por discordarem das múltiplas idéias e referenciais adotados no documento, contra a criação de mais um CAPS ad, contra reuniões distritais mensais que integram profissionais dos CAPS com as equipes dos NASF.

 

Este ano realizamos no Município de Florianópolis a primeira Conferência de Saúde Mental. A SMS jamais se furtou a realizar a conferência de saúde mental, pelo contrário, primava pela realização de uma conferência que contemplasse as discussões municipais e as regionais, já que nosso município conta com a rede mais bem estruturada da nossa região, servindo como referência para os outros municípios, e que o hospital de atenção terciária de retaguarda mantém-se em outro município.

 

Apenas com ampla discussão regional seremos capazes de exercitar a troca de experiências com municípios da região, promover a expansão da Atenção em Saúde Mental e garantir o acesso ao usuário no seu município, não sobrecarregar os serviços e garantir uma Rede Regional hierarquizada e orientada pelos pressupostos da integralidade na Atenção à Saúde, evitar hospitalizações desnecessárias e garantir atendimento com complexidade crescente em Hospitais Gerais, envolvendo os entes Federais, Estaduais e Municipais. Por esses motivos, o colegiado de gestores da macro-regional de Florianópolis deliberou a favor da realização de uma conferência regional que congregasse a todos.

 

O controle social sempre foi respeitado e incentivado, e, por isso, o Secretário  Municipal de Saúde, como integrante do CMS, incentivou a criação da comissão intersetorial de saúde mental do CMS como primeira proposta da Conferência a ser implantada.

 

Porém, não pode ser defendida como controle social a conduta de abandonar um serviço de atenção a indivíduos com sofrimento psíquico grave, em horário de trabalho, sem autorização ou sequer conhecimento das suas chefias, caracterizando desrespeito a hierarquia e descaso para com o funcionamento adequado da unidade. Tampouco representa controle social servidores municipais levarem pacientes do Hospital de Custódia, alguns com restrição de mobilidade, a uma reunião sem autorização da chefia imediata ou do próprio hospital. Tais atitudes irresponsáveis não podem ser consideradas simplesmente como “incentivo à participação de usuários em instância de controle social, conforme preconizam os princípios das reformas sanitária e psiquiátrica brasileira”. A defesa discursiva da Reforma Psiquiátrica não torna ninguém isento da responsabilidade do exercício de sua função.

 

Outro boato lamentável foi à divulgação por diversos meios, principalmente em listas de emails de universidades, de uma carta com pedido de esclarecimento sobre pacientes encaminhados para eletroconvulsoterapia (ECT) sem o conhecimento dos profissionais do CAPS, quando este procedimento, até onde sabemos, sequer está disponível no estado de Santa Catarina, o que exigiu mais uma nota de esclarecimento da SMS.

 

Também não contribui para a Reforma Psiquiátrica o descaso com o repasse financeiro para o CAPS. Diversas reuniões e oficinas foram feitas nos CAPS, em conjunto com a Gerência de CAPS e a Diretoria de Controle e Avaliação da SMS, no intuito de organizar e adequar esses registros para melhorar o financiamento e com isso garantir recursos para melhorias no serviço. Houve repercussão positiva significativa do trabalho nos demais CAPS. No CAPS II Ponta do Coral, a falta de comprometimento com a responsabilidade de preenchimento das Autorizações de Procedimento de Alto Custo (APAC) se manteve, o que ocasionou a diminuição do repasse financeiro, prejudicando a sustentabilidade do serviço. Nos últimos meses, o teto financeiro do CAPS II Ponta do Coral sofreu uma queda acentuada,  correndo o risco de passar para R$ 7.161,69. Apesar de intensa negociação da SMS com Comissão Intergestora Bipartite (CIB), o teto passou de R$ 41.083,00 para R$ 16.000,00 mensais. Os únicos motivos possíveis são a falta de registro das APACs e/ou o não atendimento dos usuários, ambos refletem um descompromisso com a causa publica.

 

O município de Florianópolis foi reconhecido pelo seu trabalho de integração da saúde mental com a atenção primária, recebendo o terceiro lugar na premiação da III Mostra Nacional de Saúde da Família em 2008. Foi reconhecido mais uma vez este ano, pelo Departamento de Atenção Básica e pela Coordenação Nacional de Saúde Mental, como um dos dez municípios com experiências exitosas em saúde mental.

 

Aproveitamos para parabenizar a todos que contribuíram e contribuem para a consolidação e aprimoramento da atenção em saúde mental de nosso município: profissionais, gestores e, sobretudo usuários, foco primordial de nosso trabalho.

 

Nossa meta não é segregar e sim congregar a todos em prol da Reforma Psiquiátrica, repensando nossos desafios e objetivos como força propulsora de mudança. Para isso, temos que estar integrados e fortalecidos. Nossas visões e metas precisam ser debatidas sempre, mas sem ficar no conflito paralisante, sem nos permitir sermos monopolizados ou monopolizadores. Abominamos qualquer tipo de manipulação, seja esta feita por indústrias farmacêuticas, ideologias, partidos políticos, sindicatos, conselhos ou instituições corporativas.

 

Citando um colega da saúde mental, militante das Reformas Sanitária e Psiquiátrica:

“O campo da saúde mental sofre hoje uma enorme ameaça não apenas do corporativismo, mas também do seu irmão siamês, o fundamentalismo. A perspectiva fundamentalista é aquela que, seja religiosa, seja laica; tem a pretensão de determinar, de forma atemporal e definitiva, a verdade última dos fatos e dos atos. No fundamentalismo não há nuances, não há caminho do meio, não há possibilidade de ser inovador e criativo, pois tudo já está dado na fixidez da doutrina correta. Se uns estão certos, os outros estão, certamente, errados. Não é apenas no segmento dos usuários e familiares, na cisão entre RENILA e MNLA, que se percebe o surgimento do fundamentalismo sectário, mas também no segmento dos profissionais, representados por seus diversos conselhos e associações. Uns atacam de fora, outros corroem por dentro. A verdade é que o sentido de ‘coletivo’ está cada vez mais posto de lado, sendo substituído por uma sociedade de cotas, de grupos, de seitas, que nada mais são do que a projeção em massa de um individualismo sem limites. Precisamos reagir intensamente contra ‘a camisa-de-força que nos classifica, que nos separa, e que acaba se transformando em um retrocesso no movimento da saúde mental’”.

 

Cordialmente,

 

 

João José Candido da Silva

Secretário Municipal de Saúde